A PALAVRA

Noções teóricas básicas.
1. Introdução
A palavra contém dois elementos: o significante e o
significado. A palavra é o signo mais importante usado pelo homem para se
comunicar, embora usemos vários outros signos como sinais, gestos, cores,
sons,....
Ex. SIGNIFICANTE SIGNIFICADO
C
Crânio........O acidente quebrou sua cabeça
A
memória.....Não me sai da cabeça o seu nome
B de
cor..........Disse de cabeça todo o discurso
E
chefe.......... Ele é o cabeça da classe
Ç
ponta..........Ele machucou a cabeça do dedo
A
1.1.Cabeça: sentido denotativo:............. sentido original, usual= crânio
1.2.Cabeça: sentido conotativo: com significado novo=
memória, de cor, chefe, ponta;
O sentido
conotativo vem a ser o sentido criado pelo contexto, pelo referente, que é a
relação motivada no próprio texto ou pela intertextualidade.
Assim: cabeça
-tem o sentido literal(próprio) que é o uso comum da palavra e tem o sentido conotativo,
quando o significado original é ampliado ou
alterado em razão do contexto,
das possibilidades do campo semântico subjacentes a ela, e da situação comunicativa..
A intenção e a
situação comunicativa é que determinam
se a palavra vai ser usada no sentido literal, normal, ou no sentido
conotativo(contexto)
1.3.A palavra tem, também, sentido polissêmico e sentido figurado, metafórico.
O sentido polissêmico é diferente da associação figurativa,
metafórica.
1.3.1.Sentido
polissêmico é quando a palavra já
incorporou normalmente os sentidos
diferentes; a relação de uso é que
determina “automaticamente” o sentido.
. Ex. ponto a)sinal gráfico( Ele fez o ponto no final da
frase);
b)
costura(Ela deu um ponto na barra da calça; Levou dois pontos na cabeça)
c)
lugar de pegar ônibus( Que ônibus para neste ponto?).
1.3.2. O
sentido figurado, metafórico (contexto+
associações que aproveitam, ampliam para
outras possibilidades de sentidos) é
quando uma palavra , cujo significado é aparentemente claro, mas num determinado contexto e determinada associação, assume outros sentidos, que precisam ser desvendados pela reserva cultural de quem a lê.
Ex.
a palavra FOGO. Num contexto, FOGO
poderá ser associado a SOL,
VERÃO, CALOR, noutro, à VIDA. Dependendo
do contexto, alguns leitores, poderão
associá-lo a AMOR,PAIXÃO,CIÚME ; outros, a GUERRA,LUTA,REVOLUÇÃO.
Isto significa que o sentido figurado é a exploração das potencialidades
da palavra; e que esta não é automática, depende do leitor, ou seja, precisa de
mediador que é aquele construirá a relação, a associação de sentido.
Esses
mediadores ( leitores), farão vir à tona o estranhamento, os sentimentos,
sensações possíveis ou inusitadas que poderão se sobressair. É uma busca do subtendido que pode ser justificado,
mas nunca definido com exatidão. Há uma
palavra, rica em significação, com novas dimensões, que
surge abrindo outros
caminhos possíveis, diante das
“pistas” sugeridas pelo autor consciente ou inconscientemente. Estas
novas significações não são automáticas; elas requerem um leitor ativo,
possuidor de bagagem cultural para
percebê-las, desvendá-las e reorganizá-las.
2.PALAVRA no texto : conhecimento prévio para uma aplicação prática.
Primeiro
passo é
observar como foi feito o agrupamento das palavras no texto..
Depois,
identificar se há uma lógica entre
as palavras e a apresentação “ do
mundo”; seja aperfeiçoando o sentido, seja ampliando o poder expressivo do texto.
Em resumo, como
base teórica acerca das palavras ,deve-se partir do seguinte: as palavras estão
constituídas em dois agrupamentos
básicos: o do nome e o do verbo.
Fazem parte do
agrupamento nominal os substantivos, os pronomes, os adjetivos e os artigos);
fazem parte do agrupamento verbal , o verbo e o advérbio que a ele se refere.
1)FORMAS NOMINAIS( substantivos, adjetivo, pronome e artigo)
sendo que o substantivo indica, representa , nomeia os seres.
O ADJETIVO revela as propriedades(características )dos seres
; revela os contornos, os matizes
diferentes que interferem no alcance do sentido
pretendido pelo nome , quer limitando, ampliando ou fazendo um cruzamento com o “eu” do emissor. Ou
seja, estabelece a aproximação do ser “ externo”, à visão do “eu” interno..
O PRONOME substitui o nome; pode indicar maior
proximidade ou distanciamento com o
nome. O pronome também informa o
emprego da linguagem coloquial
O ARTIGO vem dar caráter de precisão, nitidez ou , caráter de ambiguidade ao substantivo a
que se refere..
2) FORMAS VERBAIS
indicam ações, estados ou fenômenos. Verbo é a palavra que se conjuga no ontem, no hoje e
no amanhã; estabelecendo com o sujeito uma relação ativa, passiva ou reflexiva.
2.1.O USO DO VERBO NA
VOZ ATIVA indica que o sujeito realiza a ação, na VOZ
PASSIVA o sujeito recebe a ação
produzida por outro( ele se torna um objeto passivo); na VOZ REFLEXIVA
(forma-se um círculo) o sujeito produz e recebe a ação, pois, ao mesmo tempo, é
sujeito e objeto.
2.2.O MODO VERBAL no
: indicativo(exprime fato real, certo);
no subjuntivo(exprime fato possível, hipotético, dependente de outro);no
imperativo(exprime ordem, proibição, pedido, convite, conselho);
Obs. FORMAS NOMINAIS DO VERBO não dão prioridade ao sujeito, à pessoa gramatical, e são
elas: gerúndio, infinitivo, particípio.
No PARTICÍPIO não há
o dinamismo da ação e sim o reforço de fato concluído no passado; no GERÚNDIO há reforço da
ideia de modo, de duração de um eterno retorno, de continuidade
paulatina; no INFINITIVO impessoal há a
ausência explícita do sujeito, o que se quer é apresentar o ser, o objeto, o
fato de maneira estática, ao infinito.
2.3.OS TEMPOS verbais
fixam o momento, a duração do fato, dos
sentimentos em relação ao emissor.
NO TEMPO
PRESENTE o fato ocorre simultâneo ao
ato da fala ( se esta simultaneidade for
empregada para tornar mais real o fato que já ocorreu no passado ou que
ocorrerá no futuro, temos o chamado PRESENTE HISTÓRICO, c.p.ex.A Branca de Neve
entra e dorme na cama dos anõezinhos; Eu vou, eu preciso descansar nas férias
que vêm.
OS
PRETÉRITOS, dada a sua variedade(perfeito, imperfeito, mais-que-perfeito) apresentam possibilidades
de sentidos diferentes.
O PRETÉRITO PERFEITO
( amou) determina que o fato já se
realizou efetivamente, sendo hoje possível
ver o fato finalizado que ficou definitivamente no passado; o
PRETÉRITO IMPERFEITO (amava) estabelece outra variante para o fato que não fica
definitivamente no passado, pois ainda hoje se mantém vivo, ainda hoje mantém sua trajetória pela contínua evocação
impregnada de subjetividade e afetividade, deixando aberta
as possibilidades de seu prolongamento no presente; o PRETÉRITO MAIS QUE
PERFEITO ( amara) é aquele que expressa
um fato duplamente passado, graduado
cronologicamente por meio de outros passados, dando um sentido de maior
distância , tornando mais remoto ainda o fato.Ex.Amara as ruínas do amor que já
tinha ido embora; Era uma vez.......
Com o FUTURO. Há um presente
em que o emissor está , e um
acontecimento que irá se realizar, com maior ou menor grau de distanciamento,
envolvimento deste emissor.
Se estiver apenas, de forma neutra, se referindo a uma ação que se realizará depois do momento
atual, temos o futuro( amará); se, ao
invés, o futuro é uma afirmação
revestida de caráter de hipótese provável( se me amará, não sei), aqui já se
admite a inclusão da intenção, subjetividade de quem fala. Por sua vez, se
houver o futuro( Aonde você for, amará
com egoísmo) usado sem distanciamento,
com valor de imperativo, com valor de constatação, urgência, conselho, está-se
diante de um verbo vinculado a
sentimento, vinculado à emoção em relação ao que virá.
3. PROPOSTA DE LEITURA DO POEMA

CANÇÃO
Autora: Cecília Meireles(1901-1964)
Pus o meu sonho num navio
E o navio em cima do mar;
-depois, abri o mar com as mãos,
Para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
Do azul das ondas entreabertas,
E a cor que escorre dos meus dedos
Colore as areias desertas.
O vento vem vindo de longe,
A noite se curva de frio;
Debaixo da água vai morrendo
Meu sonho, dentro de um navio...
Chorarei quanto for preciso,
Para fazer com que o mar cresça,
E o meu navio chegue ao fundo
E o meu sonho desapareça.
Depois tudo estará perfeito:
Praia lisa, águas ordenadas,
Meus sonhos secos como pedras
E as minhas duas mãos quebradas.
( MEIRELLES, Cecília . Viagem, 1939)
No poema CANÇÃO de Cecília Meireles, há o seguinte eixo de distribuição:
1.ª estrofe: área do
nome: sonho, navio/ navio / mar / mar / mãos/
sonho (destaque-se o possessivo: meu). Na área do verbo: pus; abri;
naufragar
Nesta estrofe a autora estabelece,
por meio da primeira pessoa dos verbos e dos pronomes, que o eu-lírico está
“dentro” do poema ; ele se mostra e se
posiciona de forma clara. Ao por o
“sonho no navio” , a autora fixa o
“estranhamento”, vindo, a partir
daí, a exigência de o leitor ampliar as
possibilidades de sentido, pois se está diante de linguagem figurada,
metafórica..
Então, lançando mão
de sua reserva cultural, o leitor passa
a identificar as possíveis
associações na estrofe: o “sonho” como sendo a vivência interior [ carregada de notas subjetivas e afetivas]; “mãos” como sinédoque, a parte significando todo , ou seja, o ser, o eu-lírico lírico
se pondo por inteiro no “ navio” que tanto pode ser um receptáculo inanimado, quanto um
receptor em quem foram depositadas
as esperanças de viver com infinidade como o “ mar”
Mas as “mãos”, todo o
seu ser embarcou e remou(“abrindo
o mar”)desafiando os malogros provocados por um velejador desafortunado(“
naufragar”)
Assim, “mãos” representa a eclusa por onde flui o “sonho”
do mundo interior para o exterior; a
metáfora “navio” representa o “ outro” ,
o depositário de seu sonho por inteiro ; o” mar” , vem a ser
a perspectiva imensa ( de viver o sonho com o outro).
A partir do passo inicial percorrido, chega-se à 2.ª
estrofe, onde há a reduplicação do mesmo campo semântico descrito na estrofe
anterior. Entretanto, há uma transição para o microcosmo. Do “ mar”, ficam as
“ondas” e a sensação de cor e umidade;
das “mãos”, ficam os “ dedos” .
“ E a cor que escorre dos meus dedos/Colore as areias
desertas” identifica que ainda perdura o
esforço aguerrido do eu-lírico em
continuar, mesmo que precise investir
colorindo as areias desertas, desabitadas, áridas que se
lhe apresentam. Mesmo diante de uma realidade restrita, ainda existe a cor daquele mar.
Na 3.ª estrofe há o aniquilamento, o eu-lírico fica incapaz
de fazer frente ao” “ vento(que) vem vindo de longe” significando que de
forma insidiosa, contínua e insistente a
triste realidade foi se instaurando no
seu ser e destruindo o sonho.
Instaura-se, a partir de então, “a escuridão da noite” e “o frio”, a
higidez que faz com que se entregue, sem qualquer
resquício de “calor”, emoção, curvando-se
ao inexorável, sufocando o convívio com o outro em quem pretendia depositar seu sonho.
Cabe ao vento(que)
vem vindo de longe” , cabe a esta força de circunstância aleatória, que não se determina de onde vem, pois é “de longe” , mas que
existe de forma contínua, incontrolável,
agredir o seu “sonho” , até
fazê-lo ir ao fundo..
O navio depositário da
bagagem que era seu sonho , de sua individualidade , agora vem a ser o esquife em que
se fará o sepultamento do mesmo sonho.
Nas 4.ª e 5.ª estrofes
O eu-lírico se propõe a estancar seu sofrimento. As “águas”; o “mar” que
antes eram amplos, agora vinculam-se às próprias lágrimas, ao seu íntimo. Há a
supressão de toda e qualquer perspectiva de realização, logo, quer amainar o
seu interior, determinando-se a asfixiar
no fundo de si qualquer emoção que pudesse vir de outrem , bem como soterrando todo e qualquer sonho que possa ter sobrevivido.
Depois de sepultadas todas as possibilidades de viver o sonho haverá a
inércia da resignação, da aparente perfeição “depois tudo estará perfeito,
praia lisa, águas ordenadas” .
Será perfeição aparente porque
ficou mutilado com “ as duas mãos quebradas”.
Pode-se dizer que após soçobrado os sonhos, não há porque haver mãos.
Estar-se-á diante de um
indivíduo desfigurado, reduzido
em suas potencialidades , submisso a
um “destino” , desarticulado de suas legítimas aspirações.
A existência vivida na aridez (
até mesmo de estímulo para a
criatividade interior) é um sofrimento
insidioso que leva à própria autolimitação,
que, embora não sendo perceptível
concretamente , demarca e impõe
fronteiras a qualquer tentativa de busca de realização. E isso retira o material constitutivo da condição humana, que viverá desintegrado,
aleijado como indivíduo, “ com as duas mãos quebradas”
Nenhum comentário:
Postar um comentário