Necessito de um ser
( Mário Faustino)

Necessito de um ser, um ser humano
Contra e não ser universal, arcano.
Impossível de ler
À luz da lua que ressarce o dano
Cruel de adormecer
A sós, à noite, ao pé do desumano.
Desejo de morrer.
Necessito de um ser, do seu abraço.
Escuro e palpitante
Necessito de um ser dormente e lasso.
Contra meu ser arfante:
Necessito de um ser sendo ao meu lado
Um ser profundo e aberto, um ser amado
Mário
Faustino ( nasceu em 1930 no Estado Piauí e morreu em 1962, num
acidente aéreo nos Andes- Peru,
quando em missão jornalística para o Jornal do Brasil, onde trabalhava.) Foi
bolsista na Califórnia – EUA de 1951 a 1952.Traduziu Ezra Pound . Foi tradutor
na ONU – NY de 1959 a 1960. Autor de um
só livro: O Homem e sua Hora, 1955.
Viveu no auge do movimento concretista, foi amigo
destes escritores, mas sua poesia tem uma senda literária própria. Enquanto
Haroldo de Campos, Décio Pignatari e Humberto de Campos postulavam a morte do verso, a criação de uma poesia de
ruptura, com ideogramas, “ numa arte do espaço”, p.ex.; Mário Faustino faz uma
poesia que dialoga, reavalia o seu campo
de percepção, buscando o SER mais amplo e profundo.
Mário Faustino tem consciência da linguagem como
experimentação do fazer poético, mas
opta pela palavra, pela coesão, pela
síntese de sentidos e pela abstração dos significados.
O “sujeito” em seus versos,
no viver de cada dia mais difícil de
SER no mundo , supera o individual e ganha perspectiva
coletiva, atemporal.
Na sua realidade de busca do “ eu” ,o “ eu-lírico apropria-se do autoconhecimento e torna-se partícipe da
Humanidade.
Nota: O que escreveu
como crítico literário: (...) Há
por toda parte, uma crise do verso. Mas que, em toda parte, ainda se faz, e
pode-se fazer melhor ainda bom verso. A tradição continua, retifica-se e
continua; não se perde um bom instrumento só porque outro foi inventado(...)
in: Faustino. Mário. Poesia-Experiência. São Paulo. Ed. Perspectiva, 1977, p. 280.
SONETO ANTIGO
( Mário Faustino)
Esse estoque de amor que acumulei
Ninguém veio comprar a preço justo.
Preparei meu castelo para um rei
Que mal me olhou, passando e a quanto custo.
*
Meu tesouro amoroso há muito as traças
Comeram, secundada por ladrões.
A luz abandonou as ondas lassas
De refletir um sol que só se põe
Sozinho. Agora vou por meus infernos
Sem fantasma buscar entre fantasmas.
E marcho contra o vento, sobre etenos
Desertos sem retorno, onde olharás,
Mas sem o ver, estrela cega, o rastro
Que até aqui deixei, seguindo o astro.
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